sábado, 16 de setembro de 2017

O caso Seifert: quem está se separando da Igreja?

Roberto de Mattei

 A notícia foi divulgada por Maike Hickson. Em 31 de agosto, Dom Javier Martínez Fernández, Arcebispo de Granada, após ter suspendido do magistério o filósofo austríaco Josef Seifert, demitiu-o da Academia Internacional de Filosofia, da qual é um dos fundadores, mas que hoje depende da Arquidiocese. Deve-se lembrar que o Prof. Josef Seifert é considerado um dos maiores filósofos católicos contemporâneos. Seu currículo e sua bibliografia ocupam numerosas páginas. Mas, acima de tudo, ele é conhecido por sua fidelidade ao Magistério pontifício, o que lhe valeu a nomeação como membro da Pontifícia Academia para a Vida. Qualquer universidade católica ficaria honrada em tê-lo entre seus professores. Qual é o motivo da medida drástica contra ele? De acordo com uma declaração da Arquidiocese, o motivo de sua recente demissão é um artigo no qual o Prof. Seifert fez uma súplica a propósito da Exortação pós-sinodal Amoris laetitia do Papa Francisco.

No artigo incriminado, o Prof. Seifert pediu ao Papa Francisco para retificar uma afirmação da Amoris laetitia da qual, com base em uma lógica rígida, pode resultar a dissolução de todo o ensino moral católico.

Seifert cita a sentença de Amoris laetitia segundo a qual a consciência de casais adúlteros ou, dito de outra forma, “irregulares”, “pode reconhecer não só que uma situação não corresponde objetivamente à proposta geral do Evangelho, mas reconhecer também, com sinceridade e honestidade, aquilo que, por agora, é a resposta generosa que se pode oferecer a Deus e descobrir com certa segurança moral que esta é a doação que o próprio Deus está pedindo no meio da complexidade concreta dos limites, embora não seja ainda plenamente o ideal objetivo” (AL, 303).

Em outras palavras, comenta o Prof. Seifert, além de definir o estado objetivo de pecado grave como “não ainda plenamente o ideal objetivo”, Amoris laetitia afirma que podemos conhecer “com certa segurança moral” que o próprio Deus nos pede cometer atos intrinsecamente negativos, como o adultério ou a homossexualidade ativa.

O filósofo austríaco coloca a esta altura sua questão: “Partindo desse pressuposto, eu pergunto, a pura lógica não pode deixar de perguntar: Se um ato intrinsecamente imoral pode ser permitido num caso, e até desejado por Deus, como não deve ser aplicado a todos os atos considerados ‘intrinsecamente maus’? Caso seja verdade que Deus pode desejar que um casal adúltero viva em adultério, não deverá então ser reformulado também o mandamento ‘Não desejar a mulher do próximo’? (…) Não deverão, portanto, cair também os outros nove mandamentos, a Humanae Vitae, a Evangelium Vitae e todos os documentos passados, presentes ou futuros da Igreja, os dogmas ou os concílios, que ensinam a existência de atos intrinsecamente maus? (…) Não deveriam, então, por pura lógica, ser bons e louváveis ​​por causa da complexidade de uma situação concreta, a eutanásia, o suicídio ou assistência ao suicídio, a mentira, o roubo, o perjúrio, a negação ou traição a Cristo, como a de São Pedro, ou o homicídio, em algumas circunstâncias e depois de um ‘discernimento’ adequado?”.

Eis a súplica ao Papa Francisco: “Quero suplicar ao nosso supremo Pai espiritual na Terra, o ‘doce Cristo na terra’, como Santa Catarina de Siena chamou um dos Papas sob cujo reino tinha vivido, enquanto o criticava ferozmente (…), para retificar essa afirmação. Se as suas consequências lógicas levam com férrea rigidez a nada menos que a destruição total dos ensinamentos morais da Igreja Católica, não deveria o ‘doce Cristo na Terra’ retificar a afirmação por conta própria? Não deveria ser revogada a mencionada tese, posto que ela conduz como consequência lógica à rejeição do fato de haverem atos que devem ser considerados intrinsecamente maus moralmente em qualquer circunstância e em todas as situações, e posto que se essa última afirmação chegasse a ser negada, isso destruirá, além da Familiaris Consortio e da Veritatis Splendor, também a Humanae Vitae e muitos outros ensinamentos solenes da Igreja? (…) E não deveriam todos os cardeais e bispos, todos os sacerdotes, monges ou Virgens consagradas e todos os leigos da Igreja, demonstrar o mais vivo interesse por esse assunto e subscrever este apaixonado apelo de um humilde leigo, um simples professor de filosofia e (entre outras matérias) também de Lógica?”.

Não houve qualquer resposta à pergunta levantada pelo Prof. Seifert. A declaração da Arquidiocese de Granada se limita a afirmar que a posição do filósofo “prejudica a comunhão da Igreja, confunde a fé dos fiéis e suscita desconfiança no sucessor de Pedro, o que, no final, não serve à verdade da fé, mas aos interesses do mundo”. A Arquidiocese de Granada acrescenta “ter feito seu, desde o primeiro momento, a aplicação do texto pontifício preparado pelos bispos da Região de Buenos Aires”, ou seja, de seguir as diretrizes dos prelados argentinos que em seu documento, aprovado pelo Papa Francisco, permitem o acesso dos adúlteros à comunhão.

A atitude do Arcebispo de Granada resume-se naquela proibição de fazer perguntas que, de acordo com o filósofo Eric Voegelin, é a característica dos regimes totalitários. Com o mesmo critério foram eliminados da Pontifícia Academia para a Vida todos os católicos fiéis à ortodoxia da Igreja, a começar pelo próprio Prof. Seifert, os professores mais ortodoxos são expulsos das escolas e das universidades católicas, os sacerdotes fiéis à Tradição são transferidos de suas paróquias e, em alguns casos, suspensos a divinis. O que acontecerá com os cardeais se e quando chegar a sua correctio fraterna?

Essa lógica repressiva é a que abre o cisma na Igreja. O único argumento que os fanáticos da Amoris laetitia são capazes de levantar contra os que a criticam é aquele, fraquíssimo, da “ruptura da comunhão”. Mas os que levantam objeções à Exortação pontifícia apelam para a doutrina imutável da Igreja, da qual não têm nenhuma intenção de distanciar-se. Se eles são sancionados oficialmente por causa de  sua fidelidade ao Magistério, aqueles que os sancionam são os que fazem um ato de auto separação desse mesmo Magistério.
Os artigos do Prof. Josef Seifert são movidos pelo amor à Igreja e, sobretudo, à Verdade. O arcebispo que o pune se separa da lei natural e divina que proíbe o adultério, o assassinato e outros pecados graves, sem exceção ou compromisso. Acusando-o de romper a unidade com o Papa, o prelado reconhece a existência de um magistério do Papa Francisco incompatível com o Magistério da Igreja de sempre.

Dom Martínez Fernández puniu o Prof. Seifert porque este pediu humilde e respeitosamente ao Papa para retificar uma afirmação que conduz ao adultério e à dissolução da moral. Portanto, na Arquidiocese de Granada, como em Malta, na Argentina e em muitos outros lugares da Cristandade, para estar em comunhão com o Papa Francisco é necessário admitir, pelo menos em certas ocasiões, a liceidade do adultério e de outras transgressões da lei moral.

O Papa Francisco é o sucessor de Pedro, mas nosso Senhor não diz: ‘Aquele que me ama deve seguir cegamente o sucessor de Pedro’. Ele diz: “Aquele que me ama, aceita o meus mandamentos e os observa” (Jn 14: 15-21). Se o Pastor Supremo se desviar dos mandamentos divinos e convidar o rebanho a segui-lo, os fiéis devem afastar-se dele, pois “importa antes obedecer a Deus que aos homens” (Atos 5:29). Se para estar em comunhão com o Papa Francisco se é forçado a abraçar o erro, quem quiser permanecer na verdade de Cristo é obrigado a separar-se do Papa Francisco. É o que afirma publicamente Dom Martínez Fernández, Arcebispo de Granada.

Fonte: https://www.corrispondenzaromana.it/il-caso-seifert-chi-si-separa-dalla-chiesa/
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